quarta-feira, 22 de janeiro de 2020

Ódio na Calçada


Eu aqui estou em casa,
neste pouco e mero chão,
os pedaços e as pessoas,
já lavei da minha mão.

Já provei tanger mulheres
e ora quis ser rei no vão,
hoje guardo bem-me-queres
longe do meu coração.

Sou repulsa, sou errante,
sou corcel na contramão,
e, sentado, leso, esquivo,
odeio tudo como o cão.

Onde estás, João Infante?
Onde estás, Sebastião?
Quero ver o teu semblante
ao explodir o avião.

Quero ter contigo um trato
imortal e sem perdão:
que sejas sempre luz em vida
e que, no mais, não sejas não;

que arremedes pelo fio
e subas amplo na calçada,
e enquanto houver estio,
estejas sempre na estrada

para que, de outros reinos,
tragam, carros e cavalos,
a entreter-te, errante rei,
outros reis e seus vassalos;

e que estejas sempre vivo
pra que não se acomodem,
quantos mandes ao inferno,
eis que até os reis explodem;

e que morras, sempre, em vida,
mas que não te toque a morte,
pois o ódio é teu destino,
o desamor e a pouca sorte.

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