quarta-feira, 29 de setembro de 2010

dunas densas

(o longo vale que nos separa)

as dunas densas, dunas densas
que para sempre nos igualam
como estar sem nunca ser
e apenas ser num só lugar

dunas densas, dunas densas
que para sempre nos igualam...

A Muralha

Nós criamos a muralha
e o instinto não nos vale
e nada espera
e tudo permanece
em constante mudança
mas no fundo igual

O vale ecoa
de manhã, de manhã...

prospera o fato
de que nada
é o mesmo.

sábado, 25 de setembro de 2010

Rascunho

andarilho, na força do trilho
no meu estribilho
já não há corpo que force
e centrados entramos
e vemos e vamos
na orla de areia, espelho de
luzes...

sábado, 11 de setembro de 2010

Estudo nº 3

Olhas o mundo com desdém,
enquanto a paixão te consome.
Os coletivos passam,
os homens esperam em fila,
os engraxates esperam,
as prostitutas esperam,
e teu olhar paira distante
sobre tanta espera represada.

Permaneces inerte
naquele antigo
transe
e percebes
o quanto és pequeno
ainda,
o quanto és tolo
ainda.

Entanto, herdas um pouco de
tudo:
dos mendigos, polida esperança,
dos palhaços, a luta e a dança,
dos pássaros, a manhã!
Ode ao poeta morto!
Ode ao profeta vivo!
Ode, plasmode, desode!
Pra que tanta ode, meu Deus?
Se quiseras, apenas, (quiseras?)
botar em fogo essa paixão
que te devora o coração.

quinta-feira, 9 de setembro de 2010

Poema só para Marcelo e Marília

Na curva ruidosa dos 42
eu entro rasgando embalado a 90
(Fahrenheit, na sombra)
na estrada velha, estrada
de bem antes do meu tempo,
essas reservas colossais de tempo
de que falou o poeta
e que agora compreendo.

A floresta antiga, ancestral,
a lima da rima seca, lavada
no orvalho da Europa outonal.

(A velha cerca ao pé da estrada,
madeira, carros e ferramentas,
a vizinha de botas e jardineira
cresceu, desandou, força menina,
a chuva rala na velha estrada).

As árvores nuas no cinza do céu,
Coberto de folhas, molhado, o chão,
Na breve passagem do verde ao marrom,
Começo de outono, final do verão.

Uma Luta Diária

Eu luto diariamente para manter a minha vida e a de minha família. E notei que a felicidade vem de um esforço de abnegação. Amizade significa entrega e amor significa entrega infinita. Eu estou em busca de amor pleno e ele é incondicional.

Mas muita gente não pensa assim. É uma decisão que todos precisamos tomar, sobre o quanto podemos ou queremos amar. Eu penso que o amor precisa ser incondicional porque, nesta vida, sempre vai haver quem nos confronte.

Não sabemos o que nos está reservado, por isso é bom aprender, desde cedo, a viver e sofrer com paciência. Posso pedir ajuda a homens, mas a minha esperança está no Senhor. Por isso, a cada dia sou mais respeitoso e calmo com os homens.

Há algum tempo, diante das notícias tristes na TV, reparei que há muitos que falam de Deus, mas esquecem da democracia e da república, do socialismo e do liberalismo, do direito e da justiça. E senti clara e calmamente que o meu chamado era o de um libertário.

quarta-feira, 8 de setembro de 2010

Inocência Perdida

Ela era um 
fragmento rudimentar, 
aventurava-se com graça
quando encontrou-a,
envolveu-a em trapos e correntes 
e perfurando-a com agulhas,
saiu carregando numa caixa.

Transeuntes e policiais
interferem e descobrem
o segredo sanguinário.
Ela late, eles mordem
e morrem
pela mera e profunda 
necessidade de expressão
da sua faca.

Já vão loucos,
dois pólos opostos
em abraço exotérmico.

sábado, 4 de setembro de 2010

Estudo nº 2

Na casa de meus pais,
havia luz e vastos cômodos
esperando por serem habitados.
Placa de cobre sobre a lareira,
óleos antigos nas paredes.

Os membros, todos,
estavam fora ou haviam morrido.

O casamento
precocemente desfeito
(desamor ecoando
pelos cantos da casa).
O medo da mãe, a ânsia
do pai.

Do casal de filhos,
sobrara apenas um
(a falta de mãe,
a falta de pai).

Havia ainda uma velha avó,
uma neta crescendo
e uma cachorra,
(desde cedo
adotada como membro pleno).

Caberia à menina
retomar a senda da prole?

Ou teria, ainda,
este velho e pluvioso poeta
a fome de pôr filho no mundo,
desejo puro de gerar descendência
bem antes de muito pensar

em rosas colhidas à beira da estrada,
seu doce perfume que vem e se esvai,
musas sorridentes, oniscientes,
(a falta de mãe, a falta
de pai).

quinta-feira, 2 de setembro de 2010

A Lage

A vida inteira passada na lage,
a lage larga em frente ao quarto,
bem mais cedo, mais tarde,
melhor era a lage.

Da lage larga em frente ao quarto,
olhando o mundo passando no asfalto,
os carros correndo, destinos, trajetos,
o tempo parado passado na lage.

Da lage larga em frente ao quarto,
de repente, descer,
fazer parte do mundo,
praticar atos, ter
deveres, direitos,
questões, soluções,
iniciativa, vontade,
saudade, amor...

Mas a vida inerte aguardava na lage,
a lage larga em frente ao quarto.